quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Doenças do Trabalho

A empresária Valquíria Pamplona tem uma rotina atribulada. Ela acorda às 8 horas, toma café com os dois filhos e dá uma caminhada. Das 9h às 11h tranca-se no home office para trabalhar e de tarde visita empresas clientes. Em todos os momentos do dia ela está ligada ao trabalho. “Fico conectada à Internet o tempo todo e, sempre que abro meu e-mail, tenho pelo menos 50 mensagens para ver e responder”, diz ela.
A publicitária revela que só consegue ter saúde nesta rotina atribulada porque, além do trabalho, ela reserva um espaço para o convívio familiar e as caminhadas. Mas, para quem não consegue achar seu ponto de equilíbrio, esta tendência atual do trabalho expandido e sem limites – de espaço e de horário – vem sendo a causa principal de estresse e de outros problemas.
As consequências deste novo modo de vida se apresentam em números. Os transtornos mentais e comportamentais, como a depressão, o transtorno bipolar e a esquizofrenia, tiveram um acréscimo de mais de 12% na quantidade de auxílios acidentários concedidos pelo Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) de janeiro a novembro de 2008 em relação a igual período de 2009. Enquanto isso, os concedidos por lesões, envenenamentos e outras consequências (como entorses e fraturas) tiveram uma queda em torno de 10% e os por doenças osteomusculares (que incluem as tendinites) caíram mais de 13%.
De acordo com pesquisa da International Stress Management Association Brasil (Isma-BR), 70% dos brasileiros sofrem de sequelas decorrentes do estresse profissional. Entre elas, estão dores, cansaço crônico e depressão. Desse total, 30% estão no nível mais elevado, configurando a chamada Síndrome de Burnout.
As más posturas no trabalho podem e devem ser evitadas, mas as boas práticas não devem ficar limitadas apenas ao ambiente profissional. Muitas vezes a postura inconveniente foi adquirida durante anos. “Tudo começa com uma queixa simples que, se tratada, não levaria a incapacidade. Mas, muitas vezes, o trabalhador tem medo de falar e acaba trabalhando no limite”, diz Rodrigo Azevedo de Oliveira, fisioterapeuta e coordenador do Setor de Ergonomia da Sefit, empresa especializada em fisioterapia do trabalho.
Oliveira conta que os principais problemas dos trabalhadores que procuram a reabilitação são as lesões de ombro, punho e coluna. Para os que trabalham sentados, as pausas de cinco minutos, pelo menos, a cada uma hora são essenciais. Já quem trabalha o tempo todo de pé, precisa de assentos de repouso, além de pausas ativas (com a realização de exercícios) e passivas (no qual o trabalhador simplesmente descansa).
Ele explica que o fisioterapeuta do trabalho, além de ajudar na reabilitação do trabalhador com problemas, verifica as condições ergonômicas do local no qual este trabalhador realiza suas funções e pode até propor algumas mudanças.
“As pessoas têm que estabelecer limites”, explica Ana Maria Rossi, doutora em Psicologia Clínica e presidente do Isma-BR. “Elas têm que se dar conta de que sempre existe uma opção. As pessoas querem qualidade de vida, mas não querem perder nada. A saúde é o único bem insubstituível”, diz.
Ela lembra que o estresse (que não é uma doença, mas um processo de adaptação) acaba se tornando importante porque abre caminho para outras doenças, ao enfraquecer o sistema imunológico.
E as mulheres são as mais atingidas. O ortopedista e cirurgião de mão Adilson Seidi Suguiura lembra que a maior incidência de doenças inflamatórias das mãos acontece entre o público feminino, “talvez pela questão hormonal ou por terem uma estrutura muscular menos resistente. Além disso, elas trabalham, mas não deixam de lado as tarefas de mãe e seus afazeres domésticos”.
Zuher Handar, consultor da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e diretor científico da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamt), explica que, quando o trabalhador procura o médico com alguma queixa, “ele ou a equipe de saúde deve sempre, durante a anamnese, pesquisar a história laboral do paciente para poder avaliar se as queixas ou mesmo a doença tem alguma relação com a atividade laboral que vem desenvolvendo. Isto já foi dito e recomendado pelo médico italiano Bernardino Ramazzini, em 1700.”
Segundo Handar, a melhor medida de prevenção contra as doenças laborais ainda é agir na causa, transformando o processo envolvido no trabalho. Ele diz que, para atividades que impõem repetição de movimentos e posturas inadequadas ou que exigem muita atenção, as pausas são importantes. “A prevenção pode ser a mudança de atividades e a rotatividade nas tarefas. Fazer alongamento ou ginástica laboral é importante desde que seja bem orientada”, afirma.

Fonte: Gazeta do Povo, reproduzido por: http://www.anamt.org.br/newsletter/le_newsletters.php?idnewsletter=99&id=249

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