quinta-feira, 14 de maio de 2015

Mais prejuízo para os trabalhadores!


A MP 664/14 estabeleceu que o auxílio- doença somente será concedido após o 30º dia de afastamento. No modelo anterior o prazo era de 15 dias. Qual o impacto desta alteração ?
A tendência é que os empregados acometidos de patologias voltem ao trabalho ainda sem o reestabelecimento pleno da capacidade laboral, com quadro de cronificação das doenças, principalmente em relação aos distúrbios osteomusculares e transtornos mentais, com prejuízos irreparáveis à saúde dos trabalhadores, à previdência e ao sistema único de saúde. De outro lado, o art. 118 da Lei nº 8.2113/91 estabelece como requisito para a implementação da estabilidade acidentária, a concessão de auxílio-doença, que agora somente será devido após 30 dias. Isto quer dizer que retirou-se dos trabalhadores o direito a estabilidade acidentária após 15 dias de afastamento. Neste cenário, ampliar-se-ão as demissões discriminatórias de empregados adoentados. Da mesma forma, diversas convenções e acordo coletivos preveem a estabilidade no emprego, após o recebimento do auxílio-doença, mesmo que de natureza não-acidentária. Com a MP 664, todas estas estabilidades, que tutelam o direito ao trabalho dos empregados acometidos de patologias, exigirão afastamentos superiores a 30 dias. A majoração do prazo também afeta negativamente as notificações de doenças ocupacionais, com tendência de ampliação do preocupante quadro de subnotificação. A Organização Mundial de Saúde estima que, na América Latina, somente cerca de 4% das doenças ocupacionais são notificadas. A partir da Lei nº 11.430/06, que institui o nexo técnico epidemiológico, verificou-se uma tendência de ampliação das notificações, quadro de tende a retroceder com a atual MP 664/14. Apesar das graves deficiências verificadas nas atuais perícias do INSS, notadamente em relação ao estabelecimento do nexo causal e avaliação da incapacidade, a qualidade das medidas de atenção à saúde tendem a se precarizar ainda mais com a concessão do auxílio doença somente após o 30º dia de afastamento. A mudança em comento também afeta negativamente o modelo baseado no FAP, RAT/SAT. Interessante notar que o FAP/RAT, em razão de baixas alíquotas, dentre outros fatores, não representou uma expressiva e adequada forma de tributação das empresas que mais geram adoecimentos. O instituto nem sequer foi aprimorado e já está a sendo precarizado. Mas no Brasil, como diria o poeta: “aqui tudo é construção e já é ruína”. Em resumo: a concessão de auxílio doença somente após 30 dias - que a princípio seria uma medida que onera as empresas que mais geram adoecimentos ocupacionais - na prática trata-se de um profundo retrocesso social em relação a proteção da saúde dos trabalhadores.

A medida provisória 664/14 autoriza a realização de perícias previdenciárias pelas empresas ?
Exatamente. Mediante termos de cooperação ou convênios as empresas estão autorizadas a realizar perícias de natureza previdenciária, seja por meio da contratação de empresas especializadas ou por médicos diretamente contratados. A medida provisória também procedeu a retirada do termo “exclusivamente” da Lei nº 10.876/04 que dispõe sobre a carreira de medico da previdência social. Assim, a partir de 30/12/14, tanto os médicos das empresas quanto os do INSS tem atribuição para realizar a atividades como a  emissão de  parecer conclusivo quanto à capacidade laboral e nexo causal para fins previdenciários; inspeção de ambientes de trabalho para fins previdenciários; caracterização da invalidez para benefícios previdenciários e assistenciais. A realização de perícias previdenciárias é atividade típica de Estado insuscetível de delegação. A previsão causa absoluta estranheza uma vez que na grande maioria dos casos as empresas não procedem a devida adequação do seu meio ambiente de trabalho,  lesionam empregados em larga escala, e ainda estão autorizadas para atestar se os seus empregados estão incapacitados e se há nexo causal. A Constituição Federal não adotou o princípio de “botar a galinha para cuidar do galinheiro”, muito pelo contrário prevê a proteção á saúde, ao meio ambiente, ao trabalho decente e a vida digna. Das diversas inconstitucionalidades formais e materiais existentes nas MPs 664 e 665/14, esta é, sem sombra de dúvida, a mais flagrante violação ao ordenamento jurídico constitucional. Interessante notar que este modelo já foi adotado pelo Brasil na década de 90 e foi suprimido por, ao mesmo tempo, gerar danos aos empregados e ampliar os custos com benefícios, conforme apontado em relatório do TCU. A privatização das perícias tendo a gerar graves distorções e inclusive ampliar, em muito, as possibilidades de fraude. O curioso é que o governo alega que as medidas visam corrigir distorções. A análise profunda e técnica do conteúdo das MPVs 664 e 665, revela que o argumento do Executivo Federal é evidentemente falacioso.